*JIMMY LUV,
KING DO DANCEHALL
Vem da Jamaica um dos ritmos que mais ganhava espaço, antes da pandemia, em bailes e festas da periferia de São Paulo nos últimos anos: o dancehall. Presente tanto em festas menores que aconteciam em bares de comunidades quanto em eventos de rua com Sound Systems, o dancehall virou uma febre entre os jovens e atraia uma multidão aficionada pela música de origem jamaicana. Ao todo, segundo artistas, equipes de som e produtores, são milhares de pessoas, de diversas faixas etárias, trocando informações e festejando em bailes durante a semana e em grandes festas todo final de semana. A partir de 2014, bairros como Jardim Peri, Cidade Líder, Monte Kemel, Grajaú, Jaraguá, Jardim Pantanal, Capão Redondo, Parque Novo Mundo, Guaianazes e tantos outros, abrigaram festas em que o estilo predominou.
O dancehall (também chamado popularmente de ragga) é uma vertente da música reggae, com batidas dançantes, vocais rimados ou melódicos no estilo raggamuffin’ e muita dança. Pouco tempo depois que surgiu na década de 1980 nas periferias de Kingston (capital da Jamaica), o dancehall começou a ser produzido na Zona Leste paulistana. Artistas como Pepeu, Família Abadá, Toaster Eddie e o Grupo Kaya passaram a fazer sucesso nos bailes black dos anos 90, mas como a cena era pequena, foi esfriando e ficou estagnada por um tempo. Até que no começo da década de 2000 começaram a aparecer os primeiros artistas e DJs a difundir, de fato, o dancehall pelos quatro cantos da cidade e criar uma cena. Isso se concretizou na segunda década do século XXI, com o fenômeno dos Sound Systems nas “quebradas” da capital. Hoje há quase uma centena de sounds com suas caixas por toda a cidade de São Paulo!
Surgido nos anos 50, o Sound System é a origem do baile reggae na Jamaica – e praticamente a origem do baile de rua no mundo. Equipes de produtores de festa, com suas potentes paredes de caixas de som, começaram a difundir a origem da cultura reggae de rua, com seletores (que é como muitos nessa cena chamam os DJs) e cantores, chamados de deejay ou toaster (ou MC em outros estilos). Após quase 60 anos começou a ocorrer a mesma coisa em São Paulo, e hoje muitas equipes de sistema de som estão focadas em tocar e difundir a cultura reggae e a música dancehall.
A popularidade do dancehall no Brasil começou a crescer a partir de 2002, com festas organizadas em São Paulo pelos DJs Magrão e Stranjah e através da Família 7 Velas, coletivo considerado como uma das fundações mais importantes do ressurgimento e fortalecimento do estilo ragga no país. Fazendo rimas em português sobre riddims de dancehall e reggae, o coletivo foi fundado no Centro de São Paulo por Jimmy Luv e ganhou projeção nacional também com outros membros como Arcanjo Ras, Xandão Cruz, Sambatuh, Jr Dread e Funk Buia. Logo após vieram as primeiras cantoras a rimar no estilo: Mis Ivy e Lei Di Dai. Inspirados pela ascensão do estilo musical em São Paulo, vários cantores solo começaram a surgir na cidade e por todo o território nacional: Sandro Black, Jeru Banto e Lápide (Rio de Janeiro), Mr. Dagga e Batidão Sonoro (DF), Pump Killa e Poetiza (São José do Rio Preto), Mocambo (Curitiba), Lord Pow MX (Belo Horizonte), Fred Gomes (São Carlos), Sacal e Atômico MC (João Pessoa), Russo Passapusso e Fall Clássico (Salvador), Ragga Rural (Goiânia), Raggamano Koya e Bandoch (Porto Alegre), Complexo Ragga (Vitória da Conquista), Khal Dias (Araraquara), Neguedmundo e MC Priguissa (Natal). Mas a grande maioria dos artistas de dancehall está em São Paulo, com destaque para Michel Irie, Likkle Jota, Raggnomo, Caiuby, Toaster Nery, Dom Buya, Buia Kalunga, Guux, Skok, Rair Shekinah, Red Lion, Emcee Lê, Jr Little Car, Jah Wala, Ari Lion, Yndio Mawé, entre tantos outros talentos que surgem a cada dia nos bailes de periferia.
São Paulo é o epicentro do estilo no Brasil e diversas músicas em português compõem boa parte do repertório dos seletores. A cidade vive e respira toda essa cultura com muitas equipes de sistema de som, diversos coletivos, seletores, equipes de dança, incontáveis cantores e o mais importante: uma massa de jovens que gostam de cultura e que já incorporam o reggae como um todo à nossa cultura local. Sem dúvidas, a cidade já é um grande expoente da cultura reggae e da música dancehall, que é um fenômeno social ainda fora da grande mídia.
*Jimmy Luv – King do Dancehall, é MC e produtor. Seu estilo passa pelo reggae, ragga, rap e bass music.